Fórum Justiça

Soldados da Borracha: Breves Comentários

05/09/2012

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Há exatos 70 anos atrás, no dia 31 de Agosto de 1942 o Brasil saiu da sua posição de neutralidade declarando guerra aos Países do Eixo, tal iniciativa do Presidente da República se deu depois do nosso país ter vários de seus navios mercantes afundados por submarinos alemães. Fato este que originou grande comoção nacional, principalmente porque muitos desses navios afundados transportavam grande número de passageiros e valiosas cargas.

Aproveitando o bloqueio definitivo do fornecimento da borracha oriunda dos produtores asiáticos pelos japoneses e a grave crise originada por essa medida nos Países Aliados, principalmente nos Estados Unidos da América o Presidente Getúlio Vargas fez com que as atenções deste país se voltassem para o imenso reservatório natural de borracha – a Região Amazônica e os seus seringais. A conduta de tal autoridade objetivava, a princípio, evitar que aquele país combatente entrasse em colapso civil e militar com escassez da borracha e garantir o monopólio do Brasil no fornecimento da produção do látex com a grande necessidade desejada pelo governo americano.

Na verdade, o referido Presidente do Brasil objetivou com essa medida resolver dois problemas/situações internos tendo como financiador o país norte-americano. Naquele período de 1942 o Estado do Ceará atravessava uma calamitosa situação de estiagem. Muitas famílias flageladas pela seca foram atingidas e para se evitar que uma avalanche humana de degradados estivesse perambulando pelas ruas dos principais municípios, nada melhor do que organizar uma onda migratória emergencial para a região norte. Alistar de uma hora para outra esses flagelados candidatos a se tornarem seringueiros/soldados da borracha e resolver de uma só vez a questão do povoamento na Amazônia e o cumprimento do acordo firmado com os Estados Unidos. Estava configurado o cenário nacional e nada melhor para isso acontecer do que utilizar a figura carismática do Presidente da República, o senhor Getúlio Dorneles Vargas.

Diante desse contexto e objetivando cumprir com o que fora acordado o nosso Governo Federal à época iniciou o recrutamento de um grande número de brasileiros, pertencentes à Região Nordeste. O SEMTA (Serviço Especial de Mobilização de Trabalhadores para a Amazônia) criou um departamento de propaganda, com o objetivo de persuadir, sobretudo, a mão-de-obra masculina para deslocarem à Região Amazônica e lá aprenderem e exercerem o ofício dos seringueiros, estes denominados de soldados da borracha. Este serviço convocou padres , médicos e professores para o recrutamento de todos os homens aptos ao grande projeto que precisava ser empreendido nas florestas amazônicas.

De simples retirantes que se amontoavam com suas famílias fugindo de uma seca que teimava em não acabar e os reduzia à miséria, tais homens devido a esse mesmo efeito climático de uma hora para outra se tornaram militares arregimentados pelo Governo Federal.

Um grande número de brasileiros do Nordeste foi enviado para os seringais amazônicos, em nome da luta contra o nazismo. Uma história de imensos sacrifícios para milhares de trabalhadores que vieram para a Região Amazônica e que, em função do estado de guerra, receberam inicialmente um tratamento semelhante ao dos militares. Mas, ao final, o saldo foi muito diferente.

Destacamos que a junção dos seguintes fatores: grande nível de improvisação, somado a falta de responsabilidade com as vidas e destinos de milhares de famílias nordestinas, a carência organizacional e a desordem administrativa, todos foram os elementos responsáveis pela grande catástrofe que foi a atabalhoada convocação dos soldados da borracha para a Amazônia.

Dados coletados a época declaram que dos 20 mil combatentes brasileiros na Itália, morreram apenas 454 pessoas. Por outro lado, entre os quase 60 mil soldados da borracha, cerca da metade dessas pessoas desapareceram na selva amazônica ou morrendo em razão das péssimas condições de transporte, do alojamento, dos surtos epidêmicos, dos ataques dos animais e índios e da péssima alimentação.Consideramos esse lamentável episódio como o maior genocídio cometido dentro das nossas terras brasileiras!

No dia 15 de julho de 2011 uma importante iniciativa se deu por parte do nosso atual Governo Federal em reconhecer o relevante papel nacional desempenhado por esse segmento social que esta há muito tempo esquecido pelo Estado Brasileiro. O soldado da borracha, personagem símbolo de grande bravura, coragem e esforço na guerra da década dos anos de mil novecentos e quarenta agora possui reconhecimento formal com a sanção da Lei n.º 12.447, a qual inscreveu o nome do grupo desses seringueiros no Livro dos Heróis da Pátria.

O resgate da memória e da verdade dos fatos referentes às trajetórias daqueles milhares de brasileiros que foram recrutados/alistados durante a desastrosa “Campanha da Borracha”, esta criada durante a Segunda Guerra Mundial e que tinha como objetivo cumprir os famosos Acordos de Washington firmados com o Governo Norte Americano tem sido muito pouco tratado. Muitos soldados da borracha sobreviventes e os familiares dos milhares de mortos ainda seguem enfrentando sérios obstáculos à efetivação dos seus direitos.

No próximo dia 4 de setembro do presente ano às 17 horas no Panteão da Pátria será realizada a solenidade em homenagem a esses esquecidos e abandonados heróis brasileiros com a presença da Presidente da República Dilma Rousseff e demais autoridades brasileiras no assunto. A Defensoria Pública do Estado do Pará se fará presente enviando o seu representante, pois desde o ano de 2009 tem um projeto institucional pioneiro que objetiva garantir a esses idosos combatentes da “Batalha da Borracha” um ocaso decente. Restituindo-lhes a dignidade e efetivamente fazendo Justiça.

O Brasil ainda processa com dificuldades o resgate da memória e da verdade sobre o que ocorreu com as vítimas atingidas pelo Esforço de Guerra nos seringais amazônicos. Sendo imperioso além de debruçarmos sobre este importante fato histórico consistente na participação de um segmento social que contribuiu efetivamente para o final da Segunda Guerra Mundial e que as gerações brasileiras não conhecem pelo simples fato da desinformação, saldarmos as nossas dívidas social, patriótica e histórica com os soldados da borracha sobreviventes e seus familiares descendentes aprovando imediatamente o Projeto de Emenda Constitucional n.º556/2002 que tramita pelos corredores, arquivos e gabinetes do Congresso Nacional há mais de dez anos. Projeto que tem como pretensão a equiparação dos direitos dos soldados da borracha alistados com os dos ex-combatentes das Forças Expedicionárias Brasileiras (pracinhas).

Finalmente, lamentavelmente, cumpri-nos ressaltar, que transcorrido todo esse tempo desde a promulgação da “Constituição Cidadã”, o Estado vem se recusando a assumir o pragmatismo indispensável à viabilização da cidadania plena a essa classe de brasileiros, principal alicerce do regime democrático. O sentimento de frustração e descrédito ainda prolifera. Corremos o risco de, ao despertarmos para essa dura realidade ainda enfrentada por muitos soldados da borracha sobreviventes, termos perdido um tempo irrecuperável!

Carlos Eduardo Barros da Silva
Defensor Público do Estado do Pará

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Autor(es) SILVA, Carlos Eduardo Barros da.
Titulo Soldados da Borracha.
Subtítulo Breves Comentários.
Data de Publicação 5 set. 2012.
SILVA, Carlos Eduardo Barros da. Soldados da Borracha: Breves Comentários. 5 set. 2012. Disponível em: https://forumjustica.com.br/biblioteca/soldados-da-borracha-breves-comentarios/. Acesso em: 25 abr. 2024.